Crítica | Ao Cair da Noite
Antes de tudo, é importante dizer que a única coisa que Ao Cair da Noite possui em comum com A Bruxa é a produtora – A24. Dito isso, não será necessário traçar mais nenhum comentário sobre uma suposta aparição de Black Phillip – a cabra que, na verdade, era uma representação do demônio – no filme. A verdade é que são dois enredos bem ímpares, épocas diferentes e propostas distintas.
Trey Edward Shults, roteirista e diretor do filme, teve sua estreia com o drama familiar Krisha, baseado em sua própria família e estrelado por sua tia. Apesar de ter sido uma produção simples e de orçamento limitado, o filme agradou bastante a crítica. Mantendo a qualidade do enredo e criando uma atmosfera que nos deixa tensos durante todo o filme, Shults nos traz Ao Cair da Noite.
O enredo gira em torno de uma epidemia, um tópico aparentemente desgastado por muitos filmes apocalípticos. Entretanto, somos presos pelo roteiro, que não nos revela nenhum detalhe sobre a doença ou o que aconteceu com o resto da população. Além disso, diferente de muitos outros filmes nos quais os cenários são de caos e destruição, a casa das personagens deste longa se localiza no meio de uma floresta, onde tudo, aparentemente, está no lugar. Vamos percebendo ao longo do filme o quão complicada é a situação e a relação entre as pessoas, que usam máscaras de oxigênio – seria o contágio pelo ar? – e evitam se tocar – ou seria então pelo toque? Vamos formando muitos questionamentos, e o clima de suspense de uma rotina cheia de medo de que a qualquer momento alguma coisa poder acontecer, nos prende e nos insere nesse suspense, como se nós fizéssemos parte da história.
A casa é habitada por Paul (Joel Edgerton), sua mulher Sarah (Carmen Ejogo), e o filho de 17 anos, Travis (Kelvin Harrison Jr.). Através da boa atuação dos três, mas principalmente a de Edgerton, podemos sentir a tensão e a desconfiança que surge naturalmente em relação às outras pessoas quando se está tentando sobreviver e ao mesmo tempo proteger seus entes queridos. Paul é com certeza uma pessoa que aprendeu com as dificuldades como sobreviver e fará de tudo para manter sua família a salvo. Após a morte do pai de Sarah, que fora infectado pela doença, a família – ainda abalada – é surpreendida por Will (Christopher Abbott), que buscava suprimentos para a sua esposa e filho. Depois de entrarem em acordo, todos passam a viver juntos na casa e tudo parece funcionar bem. A questão é que Travis tem pesadelos constantes que o mantêm acordado e, em um determinado momento, não podemos dizer com certeza o que ele de fato sonhou e o que era realidade.
O enredo torna-se então um enigma se formos parar para pensar nos sonhos, ou visões, ou até mesmo memórias do jovem. Algumas das cenas realmente podem ser sonho, mas outras, se pararmos para analisar, podem realmente ter acontecido, explicando assim muita coisa que acontece depois. Ressaltando que as visões dele não estão no filme para dar susto, pois não é esse o objetivo. É claro que isso pode acontecer, mas elas são, na verdade, mais um elemento que fortalece o clima de suspense.
De fato, as informações ficam um pouco turvas quando a perspectiva de Travis está em questão, e é por isso que o roteiro se torna tão interessante e nos prende. Queremos saber o que vai acontecer, se alguém está infectado e como tudo começou. Infelizmente o filme não consegue sustentar esse modelo até o seu desfecho. Teve um começo morno, um meio interessante e um final abrupto e decepcionante.