American Gods | 1×08 – Come to Jesus
Nove semanas se passaram desde a estreia de American Gods e a promessa que Bryan Fuller fez há dois anos se cumpriu: a promissora adaptação da obra literária máxima de Neil Gaiman ganhou sim a mais respeitosa das versões live-action. Ao se unir a Michael Green, Fuller trouxe um tom especial e até surpreendente para as lacunas abertas que o livro deixava, e com o aval de Gaiman expandiu o universo da road trip de Shadow sem deixar de lado o viés mais ácido e incômodo da obra original. Logo, nada melhor para encerrar um primeiro ano essencialmente introdutório do que com deuses que dividem a adoração dos mortais de uma forma pacífica. Claramente um tapa na cara dos intolerantes religiosos de plantão.
Se os humanos garantem a existência de Ostara – a deusa Easter e dona da primavera pascal – por comemorarem a páscoa como a ressurreição de Jesus Cristo, eu venero mesmo é a querida Kristin Chenoweth, que só não toma o posto de melhor casting da temporada porque também tivemos Gillian Anderson como a deusa Media, não é mesmo? Mais uma vez a introdução da personagem encheu nossos olhos e sem a presença que Chenoweth tem, isso jamais seria possível. Desde as interações dela com um deslumbrado Shadow até o encontro com Laura e Mad Sweeney, o que ganhamos mesmo foi mais uma atriz veterana roubando a cena por estar à vontade com um papel que soaria caricatural e aborrecido sem uma entrega especial como a dela.
Para completar, Easter ainda protagonizou o arrepiante cliffhanger do finale ao tirar a primavera da Terra bem nas fuças dos novos deuses. Foi nesse momento que Wednesday também resolveu se revelar como Odin para um Shadow que de tão lento chegou a me irritar e, pela primeira vez na temporada, conseguimos comprar que o conflito que vinha se desenhando não só é real, como promete uma violência homérica daqui para frente.
Infelizmente não vimos mais nada de Salim com o seu Jinn, mas a dupla Laura e Mad Sweeney estavam lá para garantir um protagonismo mais merecido que o de Shadow. Houve um momento nesse primeiro ano de American Gods onde os papéis estendidos de alguns personagens acabaram ofuscando Shadow, e talvez por conta disso o próprio Gaiman não deu espaço para backstories que não fossem as do protagonista, ou os “Coming to America” no livro. Eu também culpo em parte o ator Ricky Whittle, mas isso pode melhorar com o tempo.
As versões de Jesus voltaram a aparecer, porém sem o impacto da primeira vez. O melhor momento mesmo foi aquele em que o “Jesus Original” de Jeremy Davis joga umas verdades sobre o cristianismo continuar maquiando celebrações originalmente pagãs como se fossem absolutamente deles. Esses momentos, pelo menos para mim, foram os que fizeram a adaptação de American Gods ser tão necessária para época em que vivemos. Quanto mais as séries conseguirem jogar na cara da sociedade a hipocrisia barata que certos discursos evocam, mais eu vou continuar amando TV.
O retorno de Bilquis fechou uma parte do primeiro ano ao finalmente conhecermos o final da sua história. Numa parceria com os novos deuses, mais precisamente com o Garoto Técnico, a antiga deusa do amor vai servir de espiã no encontro da House on the Rock. Não consigo imaginar o que isso possa significar para o futuro da série, mas parece tão promissor quanto o encontro de Laura e Shadow logo que ela descobre quem foi o mandante do seu acidente.
American Gods não fez uma primeira temporada perfeita, mas deu um primeiro passo com um glamour sanguinário sem esquecer a relevância dos seus discursos para sociedade atual. Eu disse lá na review da première que ela é um dos shows essenciais de 2017 e não retiro uma palavra. Indispensável sim!