Crítica | O Mínimo Para Viver
O novo filme da Netflix, dirigido e escrito por Marti Noxon, conta a história de uma jovem adulta que tem anorexia. Nessa jornada de tentar se livrar da doença, ela conhece um doutor nada convencional que a desafia a encarar sua condição e abraçar a vida.
Depois da polêmica série 13 Reasons Why, que trata de uma jovem que comete suicídio, o novo longa do serviço de streaming agora traz mais um outro assunto que gera discussão: a anorexia. Antes mesmo de estrear, assim que o trailer de O Mínimo Para Viver foi lançado, já havia surgido diversos debates sobre como o filme apresentaria um tema tão delicado sem trazer uma glamourização para a doença. Lily Collins, a protagonista que interpreta a jovem Ellen, é alguém que já sofreu com distúrbios alimentares na adolescência e a mesma já disse que fazer o longa foi algo para assumir seu passado e trazer esclarecimento às pessoas que ainda sofrem com tudo isso.
O que nota-se no filme é a preocupação em mostrar durante suas quase duas hora de duração o triste lado de quem sofre com a anorexia e o que ela causa na vida da própria pessoa e dos seus familiares. Apesar do ritmo um pouco lento, o roteiro foca apenas em nos apresentar Ellen, que fica contando as calorias de tudo o que ela poderia comer, quando encontra o Dr. William Beckham (Keanu Reeves) e a sua vivência numa nova internação para tentar tratar da sua condição. O filme é sobre conhecer alguém que pode ajudar a mudar a sua vida, e ele se torna honesto ao focar nisso, não querendo ir totalmente adiante sobre como a história irá terminar ou voltar muito atrás, quando tudo começou.
O destaque fica por conta de Lily, que está em um dos seus melhores papéis e, consequentemente, sua melhor atuação até então. Por ter vivenciado algo relacionado com este distúrbio, ela entrega tudo de si. E esse tudo de si vai dos momentos descontraídos até quando ela precisa se mostrar ainda mais debilitada e desesperada com toda aquela situação. Já o Dr. William, que entre sinopses e trailers sempre surgiu com destaque, aparece apenas em momentos pontuais da trama, mas que são de extrema importância e cruciais para a personagem e toda a sua trajetória. Ele é alguém importante para o longa, mas, como já dito, Ellen é quem carrega a história sozinha mesmo quando não tem a ajuda de algum personagem de apoio.
A dinâmica na casa de internação com mais seis jovens é interessante de acompanhar. Mesmo com problemas um pouco diferentes, todos eles passam pela mesma situação e possuem distúrbios alimentares. O destaque deste núcleo é o personagem Luke (Alex Sharp), que serve como base para a reviravolta na vida de Ellen.
A ausência do pai de Ellen durante todo o filme traz um ar ainda mais concreto de como aquela pessoa que deveria estar lá nos momentos mais difíceis da filha, não está. Ele não aparece, seu nome não é citado e nem mesmo uma pequena foto dele é mostrada. Ele é o provedor da sua família e isso é claro, mas nem mesmo todo o dinheiro do mundo e os melhores tratamentos que paga para a filha não são suficientes para que cubra a sua ausência quando ela precisa. Para cobrir essa falta, Susan (Carrie Preston) faz o que pode e o que não pode para suprir as necessidades paternais da menina. Mesmo não sendo sua filha biológica, ela é a única que não desiste da enteada, e mesmo com a atuação costumeira de sempre em diversos filmes e séries, Carrie mostra o que realmente uma mãe deve ser nesses momentos para uma filha.
Muitos fatores são mencionados do porquê a jovem mulher poderia ter desenvolvido aquele tipo de condição: se é sua mãe Judy (Lili Taylor), que tem transtornos bipolares e separou-se de seu marido para ficar com sua melhor amiga Olive (Brooke Smith), a ausência do pai ou qualquer outro fator que poderia ter desencadeado tal comportamento, buscando uma explicação que simplesmente não existe.
Duas cenas são extremamente marcantes e muito bem trabalhadas exatamente para aquele momento: a da chuva e a cena entre mãe e filha em uma barraca. Ambas trazem à personagem as extremas necessidades que sente e o que falta para ela ter um impulso para tentar melhorar. Muito no filme é marcante e impactante, mostra a real situação do corpo da personagem, mas consegue te fazer ser otimista quanto aquela situação para que algo pudesse melhorar a partir daquele ponto.
O ponto de virada é algo muito bem trabalhado e certeiro quando chega o momento no qual tudo depende só de um fator: ela mesma. Assim como em diversos tipos tratamentos de problemas psicológicos ou de vícios, a melhora da condição sempre depende apenas da própria pessoa, pois nada pode ser forçado. Além disso, se não tiver comprometimento de todas as partes, o resultado final não será satisfatório.
A Netflix apresenta O Mínimo Para Viver como mais uma forma de debate para este assunto, que às vezes não é tão mencionado como deveria ser e que muitos se calam quando surge à tona. Este tipo de filme é importante para que haja conversas sobre, buscando o esclarecimento, a compreensão e não sendo glamourizado para que as pessoas achem que é bonito passar por algo tão delicado e prejudicial.