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Os Defensores | A primeira temporada

E finalmente a tão aguardada série que reúne Demolidor (Charlie Cox), Jessica Jones (Krysten Ritter), Luke Cage (Mike Colter) e Punho de Ferro (Finn Jones), os quatro heróis da Marvel/Netflix, estreou e não poderia ser mais decepcionante. A empolgação e o hype que se gera nas séries de heróis da Netflix é sempre superior ao que nos é dado para assistir. Por isso, muitas vezes quando assistimos, a experiência de acompanhar a saga desses heróis pode ser frustrada.

Mas antes de falar sobre a história da série, vale ressaltar a química que Charlie, Krysten, Mike e Finn têm em cena. Por mais que a série tenha defeitos, os quatro interagem super bem, mesmo com personagens que tenham personalidades diferentes e fortes. Principalmente Luke e Danny, que possuem uma interação ainda melhor e que dá para notar que uma amizade pode surgir deste encontro. A série não é ruim, longe disso, mas ela não é boa também. É aquele tipo de série que se existir ou não, não faria qualquer diferença para quem acompanha de verdade. Nada que uma explicação ou uma trama rápida em alguma produção solo desses heróis não cumprisse o papel de Os Defensores.

É bom começar por uma das coisas que mais teve destaque, principalmente no primeiro episódio: o tipo de iluminação para cada herói. A do Demolidor vermelha, a da Jessica Jones um tom mais azulado, a do Luke Cage amarelada e a do Punho de Ferro mais voltada para o verde. No começo, é bem legal acompanhar esse jogo de cores para cada herói e ver nitidamente a diferença nas realidades de cada um. Além do mais, as séries da Marvel/Netflix, diferente dos filmes do MCU, são mais sombrias e realistas, então quando você consegue ter algo que dá mais vida àquele universo, é de muito bom grado. Porém, com o decorrer dos episódios, isso vai se perdendo… E bastante. É usado em excesso no início, mas lá pelo quarto capítulo isso já não existe mais, já que os heróis estão juntos agora.

Por um lado é compreensível, mas, por outro, poderiam ter usado outro tipo de saída. Por exemplo: quando um deles fosse o destaque, sua cor prevaleceria, ou ainda quando estivessem sozinhos, cada qual teria de volta sua iluminação. O problema é que se fosse para perder algo que foi um destaque da série e que muita gente gostou, por que utilizar então só no início, já que essa técnica não faria mais parte posteriormente? A cena na qual os Defensores estão conversando pela primeira vez juntos, aquela do restaurante, é um ótimo exemplo de como isso poderia ter sido utilizado, já que esse recurso foi dado ao espectador. Cada ponto do salão tem uma cor em destaque, fazendo assim uma mistura de todas elas entre os próprios heróis.

As transições de núcleos, quando mostram partes dos bairros, o metrô e mais os “filtros” de cada personagem, são utilizadas em excesso para passar de um herói a outro durante os dois primeiros episódios, mas é algo que também se perde conforme o desenrolar da trama. Chega até ser um pouco brega o tanto que são usadas, porém elas nos situam sobre qual personagem vem a seguir. Então os episódios finais chegam e simplesmente quase não as usam mais. Fica aqui o questionamento sobre utilizarem tanto este recurso no início e, depois, esquecerem totalmente.

Como dito acima, quando esses efeitos de iluminação já não fazem mais parte da edição, lá pelo episódio quatro, é porque os heróis finalmente se reuniram. Isso mesmo, caso você ainda não tenha visto, demoram praticamente QUATRO episódios, de uma série de OITO, para, finalmente, Matt, Jessica, Luke e Danny se juntarem. Na verdade, é no final do terceiro episódio que a primeira luta em grupo acontece, mas faltando cinco minutos para acabar.

Uma série denominada Os Defensores, que é um crossover entre quatro heróis que já possuem pelo menos uma temporada solo cada, demorar quatro episódios para que a primeira reunião entre eles aconteça, acaba sendo uma falta de respeito tremenda com quem acompanha todo esse universo. É claro que tem que ter uma introdução e mostrar também onde cada personagem está depois do fim de suas histórias contadas em seus projetos separados, mas demorar isso tudo é enrolar na cara larga toda a trama que está sendo construída. O primeiro capítulo nada mais é do que uma grande introdução de 50 minutos, que poderia ter sido feita em 20, no máximo. E então é forçada cada situação de cada herói para que, no fim, todas as pontas convergissem num ponto principal que seria a grande trama da temporada.

Nessa introdução, a que mais me incomodou foi a de Jessica. No final de sua primeira temporada, o seu amigo Malcolm (Eka Darville) atende o telefone da Alias Investigations, dando a entender que, por mais que Jessica recuse, ela iria voltar a fazer o seu trabalho como investigadora. Mas então, quando o primeiro episódio de Os Defensores começa, a gente vê que ela não quer mais trabalhar nisso e reluta muito para pegar o caso. E também, no final desses oito episódios para a personagem, parece que seu fim é exatamente o mesmo da série solo.

Jessica é, de longe, o melhor personagem desses quatro que já nos foram mostrados. Ela é engraçada, irônica e a atriz é ótima no papel. Matt é o segundo melhor, se formos colocá-los em uma escala. Por mais que ele seja sombrio e a cada cinco minutos lembra que não quer ser reconhecido (mas todo mundo já sabe quem ele é), ele é coerente com a sua história e com tudo o que passou. Quando a trama da igreja aparece, muito pouco inclusive, nesta temporada, é um dos momentos mais altos do personagem, que vive num dilema entre sua crença e o que precisa ser feito.

Luke é um bom personagem também, mas em aqui ele está mais apagado, já que tinha que dividir o holofote com os demais personagens. Porém, o discurso sensacional sobre privilégio branco que ele fez ao Danny não poderia ter sido melhor. Falando em Danny, ele é o mais chato dos quatro. Em Punho de Ferro, dá para aceitar o jeito que o personagem é. O cara saiu de um mosteiro e foi para o mundo, sem percepção alguma de como poderia viver em sociedade e com a tecnologia utilizada hoje. Mas isso deveria ser assim só na primeira temporada de sua série solo, pois quando o personagem cresce, precisamos ver que ele evoluiu também. Então chega em Os Defensores e Danny continua sendo chato, parecendo uma criança e totalmente delusional… Não dá.

Falando em Danny, a trama principal de Os Defensores e seus vilões saíram da própria história de Punho de Ferro, a temporada que os fãs das séries de herói da Netflix menos gostaram. Pegar algo que muita gente não gostou e fazer dele a principal trama da união dos heróis é um erro. Mas, pelo menos, a história é muito boa. É explicado como o Tentáculo surgiu e qual a motivação dos cinco membros dessa organização, porém o desenvolvimento da trama é lento, muito lento, e colocam até cenas que não fazem sentido algum e que não agregam nada à história só para encher linguiça (como Alexandra alisando um disco e olhando sua vitrola).

No fim, quando tudo o que os vilões queriam acontece (quem poderia prever?), que é obter a substância da vida eterna, o roteiro também usa uma explicação que não é boa. Só mostram os ossos do dragão sendo separado e nada mais. Além disso, não fica claro o objetivo do porquê eles querem destruir Nova York: é dito isso, o terremoto é causado, mas e aí? Quais são as reais motivações? E então Madame Gao diz em um certo momento que quer voltar para casa. Os vilões possuem vários objetivos, mas nenhum é explicado direito.

A construção da vilã principal Alexandra (Sigourney Weaver) é uma das únicas coisas do primeiro episódio que não cansa. É bem feita e situa como a personagem é e como ela está. Com o desenrolar da trama, ela só vem numa ótima crescente, até que, num ponto de virada, tudo que foi trabalhado até então é jogado no lixo da forma mais ridícula possível. Complica mais ainda quando, depois de todo um trabalho em nos fazer achar que ela seria a ótima vilã da história, colocam um dos piores personagens da segunda temporada de Demolidor para assumir este papel, a Elektra. A história dela faz sentido? Faz. O personagem é bom? Não. Esse é o problema. Alexandra vinha crescendo, uma personagem construída do zero na série, e em seis episódios ela vai se mostrando ainda mais importante. Porém decidem que Elektra será a vilã principal… E isso não ficou legal.

Os vilões adicionais, Bakuto (Ramon Rodriguez), Madame Gao (Wai Ching Ho), Sowande (Babs Olusanmokun) e Murakami (Yutaka Takeuchi), aparecem bastante, porém não possuem muita importância e servem apenas para os momentos de luta na série. Murakami, em sua primeira aparição, passa um certo medo e faz parecer que o personagem será mais do que apenas um vilão comum, só que no fim é mais do mesmo. Sowande só é necessário para sequestrar Luke Cage, algo que é resolvido sem nem ser mostrado, e gerar um conflito entre os quatro. Bakuto tem a sua obsessão por Colleen, assim como em Punho de Ferro, mas também tem pouca importância. E Madame Gao, que até hoje, mesmo depois de todas as séries pelas quais passou, tem momentos em que nos mostra ser uma personagem com poderes extraordinários, mas esquece de utilizá-los.

Na verdade, o grande vilão desta temporada é a parede. Pois não é só uma vez, mas várias vezes em oito episódios, que as pessoas são jogadas contra a parede, desmaiam, ficam pouco tempo desacordadas e então voltam. Todo mundo que é jogado contra a parede acontece a mesma coisa, é só reparar.

Ainda que os vilões sejam mais do mesmo, eles não chegam a ser nada importantes como Karen Paige (Deborah Ann Woll), Foggy Nelson (Elden Henson), Malcolm e Trish Walker (Rachael Taylor). Esses personagens não servem para absolutamente NADA e não têm motivo algum para estarem ali. Por mais que os heróis precisassem manter seus amigos seguros para que nada de ruim os acontecesse, a inclusão desses personagens só fez a série perder ainda mais tempo, pois com uma ou duas frase seria muito mais prático resolver a situação da segurança deles.

Porém, Misty Knight (Simone Missick), Claire Temple (Rosario Dawson) e Colleen Wing (Jessica Henwick), diferente dos outros personagens coadjuvantes, possuem seus destaques e são até mais importantes para a trama. Se analisarmos bem enquanto assistimos, a presença dessas três não faz qualquer diferença e tudo poderia ter sido resolvido entre os quatro personagens principais. Mas, por outro lado, é até bom que o foco não seja só essas pessoas e que as três que mais se destacaram como coadjuvantes tenham seus poucos momentos para brilhar. O problema é que as três não estão bem desenvolvidas aqui como quanto nas séries solos que participaram.

Colleen é o maior exemplo disso. Ela virou apenas uma seguidora do que Danny faz e sua maior motivação é derrotar Bakuto depois que descobre que ele está vivo. Essa era uma personagem até que divertida, carismática e uma boa sidekick para o Punho de Ferro, mas parece que ela virou até “companheira” demais dele e só sabe fazer isso. Claire é sempre um destaque quando aparece nas séries solo. A sensação é de que toda vez que ela entra em cena as coisas melhoram, porém, dessa vez, ela aparenta não ter carisma algum e sua trama é só dar opinião. Nem parece que estava sendo treinada em Punho de Ferro, e suas técnicas de cuidados médicos são pouco utilizadas.

Por fim, Misty foi um dos personagens preferidos de Luke Cage, mas a impressão aqui é de que a policial sofreu uma reinicialização no cérebro e tudo o que construíram dela foi jogado fora. Misty se esqueceu do que realmente aqueles vigilantes são capazes. Claro que ela é uma policial e esse dilema entre o que a lei quer e o que precisa ser feito é um dos principais da personagem, mas parece que isso só é lembrado nos dois últimos episódios e faz com que ela se torne chata e desnecessária até para a trama.

Um dos melhores pontos de Os Defensores, em comparação com Punho de Ferro (a última série feita pela Netflix antes do crossover), foi a coreografia do próprio Danny Rand. Ele está lutando melhor e agora aparenta mais ser um lutador de artes marciais, diferente da sua série solo. Matt Murdock também sempre foi e continua sendo um destaque na hora de suas lutas. Ele se parece bem mais humano que os outros três na hora de lutar: se cansa e se esforça ainda mais para que tudo se resolva.

Já Jessica e Luke ficaram bem estranhos lutando. Primeiro que quando começa uma cena de ação, percebe-se que eles estão esperando o diretor dizer “ação” para começarem a lutar, principalmente naquelas em que a superforça que eles têm é utilizada. E essa superforça é outro ponto que diversas vezes não tem coerência. Luke consegue ficar parado ao receber tiros, mas quando algum lutador vai bater nele, ele é jogado, apanha, sente dor e nem parece que sua pele é impenetrável. Jessica também, mas em menor escala. Tem vezes que sua superforça aparece, outras não.

Duas cenas de ação são destaque: a primeira vez que lutam juntos em um corredor e a cena final, quando fazem um plano-sequência ao mesmo tempo em que a câmera vai girando e mostrando os heróis lutando naquele lugar. As demais não surpreendem muito.

O texto da série também é problemático. Em diversos momentos em que os personagens estão conversando ou até contando alguma história importante, você consegue prever exatamente o que um ou outro vai falar a seguir. Um exemplo é a cena quando Luke se despede de Jessica no restaurante e ele a chama e ela se vira. Todo aquele diálogo é previsível e é utilizado em diversas séries ou filmes, assim como a volta dela no momento em que mais precisavam, algo totalmente esperado. O roteiro é um show de coisas que você consegue saber o que vai acontecer mesmo sem nem pensar muito. A trilha sonora é outro ponto que causa certa confusão, principalmente na cena final. Existe uma trilha de tensão na luta principal, mas então quando a câmera começa a girar, surge um hip hop que toma conta e não dá para entender a mudança drástica do tom que estava sendo trabalhado até então.

Matt Murdock é o único a utilizar traje de herói entre os quatro, e isso faz sentido para a história de todos eles, mas visualmente chega a ser cômico. Para que ele não seja o único “fora da casinha”, rasgam a camiseta de Danny Rand só para que a sua tatuagem de chiclete de Dragão apareça e faça uma alusão ao seu traje nos quadrinhos.

A season finale de Os Defensores é o melhor episódio… Até os 15 minutos finais. Por mais que explicações e furos existam e algumas coreografias de Luke e Jessica sejam um pouco ruins, você não se importa, pois tudo o que vai acontecendo é empolgante. Mas aí vem o “pós”, já que tudo foi resolvido e é um festival de cafonice e coisas óbvias sem fim. Como foi dito lá em cima, Jessica parece ter o mesmo final que teve em sua série solo, e Luke continuou na mesma ali também.

Danny tem o final que mais surpreende, já que Matt pediu para ele cuidar de Hell’s Kitchen. Então, no fim, vê-lo observando o bairro foi bem interessante. E é claro que o Demolidor não iria morrer, mas precisava ser utilizado o choque velho de “matamos o personagem, mas ele está vivo e passa bem”. Dá para entender como um prédio de dezenas de andares cai em cima da cabeça de uma pessoa e ela continua viva apenas com hematomas? Sim, é uma série de herói, mas precisa haver coerência com aquilo que se faz.

Enfim, Os Defensores é um balde de água fria para muitos que estavam esperando a reunião desses quatro heróis. A trama é boa, porém mal trabalhada e desenvolvida, e há uma ótima vilã, mas que é tirada de cena quando tudo poderia ser mais interessante. Temos ótimos heróis, mas o desenrolar da história não ajuda muito a nos fazer gostar da trama principal. Vale a pena conferir a série para que cada um tire suas próprias conclusões, pois ela não é a pior do serviço, mas, sem dúvidas, é a mais problemática entre as séries da parceria Marvel/Netflix.