Fora de Cena | Um Assaltante Bem Trapalhão
Um Assaltante Bem Trapalhão – esqueça esse péssimo título brasileiro –, ou no original Take the Money and Run, conta a história de Virgil, um ladrão fadado ao insucesso em todas as suas empreitadas. Contado em forma de semidocumentário (com depoimentos intercalados com situações dramatizadas – tudo, evidentemente, falso), a produção gira em torno de seu personagem central, interpretado pelo próprio Woody Allen. No decorrer da história, Virgil passa por situações que vão do bizarro ao hilário, num esforço bem-sucedido de entreter, agradar e divertir o espectador.
De certa forma, este filme pode ser considerado o embrião de quase tudo que o diretor experimentaria em sua carreira de mais de quarenta filmes, principalmente naquilo que é uma de suas características mais fortes: o humor. Nesta produção, faz uso de três formas que se tornam marcantes no decorrer do seu trabalho. A primeira delas é a ironia. Nesse ponto, ele é mestre. Às vezes tão sutil quanto possível; outras, ácido e direto. O que importa é a inteligência do texto, que vai ao lugar certo e traz um olhar particular sobre os acontecimentos. A segunda é o humor visual, característico, principalmente, dos seus primeiros filmes (em especial os quatro primeiros). Aqui o humor visual se apresenta para mostrar o lado trapalhão de Virgil. Pode-se dizer que, entre as formas de fazer rir, essa talvez seja a mais fácil e menos valorizada – porém faz render uns dois ou três bons momentos. E, por fim, o nonsense que é identificado em algumas piadas ao longo da história.
Além do humor, vale dizer que o roteiro é ágil e mescla na dose certa os depoimentos e as cenas dramatizadas. Jamais fica a sensação de que o diretor está abusando do recurso. Vale dizer ainda que o formato ajuda a compor o estranhamento do personagem, ou seja, está ali a favor do objetivo de contar uma história. De caráter sutilmente autobiográfico (a data de nascimento do personagem é a mesma do diretor), Um Assaltante Bem Trapalhão traz um personagem deslocado do meio em que vive, alguém que se vê diferente dos demais e, ao mesmo tempo, inadequado, fora de lugar. No entanto, esse personagem não desenvolve a consciência de si mesmo, apenas age assim porque roubar é o que sabe fazer, o que está ao seu alcance. Nesse sentido, pode ser traçado um paralelo com o artista, que se vê diferente do padrão – e se expressa pelo que é preciso.
Esta foi a primeira tentativa de Woody Allen protagonizando, dirigindo e escrevendo uma comédia, mostrando um roteirista de grande potencial, com boas tiradas espalhadas por todo o filme. A história consegue manter um bom ritmo, mesmo que se repita em alguns momentos, com as diversas vezes que Virgil vai preso. Como ator, Woody Allen não decepciona e começa aí a desenvolver seu estilo próprio de entregar o texto que continuou sendo desenvolvido nas comédias que se seguiram.