Crítica | Thor: Ragnarok
Thor: Ragnarok é, de longe, um dos filmes mais divertidos já produzidos pela Marvel. Isso mesmo, você não leu errado. A trama, apesar de se apresentar sombria no trailer, entrega uma obra engraçada e irônica, capaz de superar até mesmo o divertido sarcasmo do nosso querido Tony Stark. Essa nova perspectiva coloca um fim na seriedade vendida pelo Deus do Trovão nos dois primeiros filmes da saga, inserindo um humor até então desconhecido pelo público que acompanha o personagem.
Uma prova desta nova fórmula é o início da narrativa. A sensação transmitida é de que o asgardiano conversa de forma natural com o espectador, deixando claro o intuito do diretor Taika Waititi de situar as pessoas sobre o que será abordado na premissa que introduz de forma objetiva o princípio do Ragnarok – um evento apocalíptico da mitologia nórdica que tem como foco a destruição do reino Asgard.
Logo após, acompanhamos o retorno de Thor para casa e somos levados ao descobrimento da farsa de Loki (Tom Hiddleston), que comanda um trono repleto de futilidades ao se passar por Odin (Anthony Hopkins). Em seguida, embarcamos em uma missão de resgate na qual os dois irmãos tentam localizar o pai, que se encontra em algum lugar da Terra. Neste mesmo cenário identificamos a chegada da cruel Deusa da Morte, conhecida como Hela (Cate Blanchett), e uma sucessão de acontecimentos faz com que Thor vá parar no misterioso planeta Sakaar, onde o herói terá que enfrentar o então “amigo” Hulk em uma arena em que será forçado a superar muitos desafios para conseguir retornar e evitar o que ele acredita ser a destruição de Asgard.
O roteiro caminha por variados locais na medida em que realiza de forma sútil a apresentação e a transição desses diversificados universos. O enredo manifesta desde o começo que não há espaço para o desenvolvimento de possíveis dramas, sustentando grande parte da obra em frases que criam um ambiente repleto de chacotas. O título explica, mas não é capaz de se aprofundar na origem da vilã Hela, deixando no ar perguntas sobre a própria origem, força e passado dela. Hulk divide grande parte da tela com o protagonista, reforçando o quanto seu papel foi fundamental para essa nova imagem da história. Loki atua como mero coadjuvante, mostrando o quanto pode ser previsível, já que não consegue mais aplicar os conhecidos truques maléficos no irmão mais velho. Alguns personagens importantes são retirados de forma brusca da narrativa, ao passo que outros são inseridos com o mínimo, ou total, ausência de qualquer informação.
A direção de Taika Waititi é funcional e renova a franquia, explorando esse lado descontraído do grupo Thor, Hulk, Loki e Valquíria. Ainda que abuse dos efeitos especiais, as cenas de ação são violentas e bem construídas, revelando uma proporção audaciosa na medida certa. O diretor aplica uma pomposa visão colorida no planeta Sakaar e aposta em construções e figurinos exagerados, claramente apoiados na passagem dos anos 1980/1990. A trilha sonora acentua esse conceito oitentista, no qual as músicas induzem uma sincronia com a narrativa.
Chris Hemsworth embarca no senso de humor de Waititi, sendo capaz de consagrar pela primeira vez a verdadeira personalidade do Thor, apto a entregar um super-herói animado, divertido, que sabe rir de si mesmo e que precisa aprender a “caminhar” sem o poderoso martelo. Acompanhamos o ator ser eletrocutado, nocauteado e arrastado para as muitas situações constrangedoras nesta jornada de descobrimento que ensina o preço do respeito, deixando de lado aquela besteira de ele ser intocável por ser considerado uma divindade. O público também conhece o que seria um novo Hulk infantil, mimado e inseguro na pele de Mark Ruffalo, descobrindo como o monstro verde deseja ser querido e ovacionado pelas multidões por onde passa, ato que reflete a frágil personalidade do alter ego Bruce Banner, constantemente discriminado e temido na Terra.
Cate Blanchett rouba o foco logo que desponta em tela, interpretando com sagacidade uma vilã renegada e descontente com o destino de Asgard. As expressões faciais anunciam grande parte do ódio e da revolta que a atriz quer transmitir, sustentando no olhar um teor de superioridade perante aos outros que a envolvem. Tessa Thompson funciona bem no papel que lhe foi designado, principiando o poder da mulher através das protetoras nomeadas Valquírias. Ela institui de forma simples quem foi esse clã de guerreiras, recordando muito o formato assistido em Mulher-Maravilha. Tom Hiddleston encena o mesmo Loki de sempre, mas agora com uma pitada mais amigável e icônica perante ao irmão Thor, exibindo pela primeira vez uma possível relação de família.
Como todo filme Marvel, Thor: Ragnarok não implementa uma mensagem de reflexão sobre a história, manifestando ser produzido apenas para dar prosseguimento à sequência dos acontecimentos que irão resultar nos eventos do aguardado Guerra Infinita. A revolução do diretor Taika Waititi é expressiva e necessária, renovando o fôlego que foi totalmente perdido no segundo filme da ficção. Entretanto, o preço dessa ridicularização é alto e faz com que o espectador não se envolva com a iminente destruição da civilização de Asgard, visto que ficamos aguardando a todo momento uma imediata piada. Os assíduos fãs dos quadrinhos podem se decepcionar com essa nova singularidade, mas o título cumpre com o objetivo de entretenimento e atrai uma gama de jovens e adultos aos cinemas. Este é o melhor filme da trilogia do Thor, indicando que essa mitologia não precisa ser tão séria para conseguir agradar.