Fora de Cena | OMG: Oh My God!
A Fora de Cena desta semana não vai falar de um filme antigo, mas sim de um filme indiano. Este se enquadra na proposta da coluna, embora tenha sido lançado em 2012, de divulgar longas não muito conhecidos e/ou diferentes e você pode ter certeza de que a indústria cinematográfica da Índia tem muito disso para oferecer. Para que um filme tão bom como este não se perca no emaranhado da Netflix, vamos falar dele nesta edição na esperança de que, ao terminar de ler o texto, você corra para assisti-lo.
Todos sabem que ninguém é igual a ninguém e que há uma série de pessoas cujo pensamento é totalmente distinto do de outras. Quando se trata de religião a polêmica aumenta, muito por conta do fato de que tudo ligado à religião gira em torno da fé e o quanto as pessoas estão dispostas a acreditar no que está escrito nas escrituras e no que pregam seus ministros. Ao mesmo tempo que o número de crentes é muito grande, o número de ateus também é. Afinal, para algumas pessoas é realmente difícil acreditar cegamente em algo que não tem, aparentemente, nenhum fundamento. OMG: Oh My God! é um filme que irá abordar a questão da fé de uma maneira extremamente inusitada e muito bem-humorada, deixando clara a qualidade de seu roteiro e de seus atores.
A história gira em torno do descrente Kanji Lalji Mehta – calma, você se acostuma com os nomes -, interpretado por Paresh Rawal (se você assistir um filme indiano na Netflix, começará a receber indicação de vários outros e perceberá que esse ator está em vários dele). A primeira ironia cômica do longa é apresentada logo no início: Kanji é ateu, mas é dono de uma loja especializada em ídolos, ou seja, ele vende imagens de Buda, Krishna, etc. Apesar de sua vida ser sustentada pela crença dos outros, Kanji não acredita em nada do que o hinduísmo prega e vive desrespeitando as tradições da religião, irritando e enganando muitas pessoas por conta disso.
Tudo parece bem, até que um terremoto destrói a loja de Kanji – o engraçado é que a loja dele é a única que sofre danos por conta do acontecido, o que nos faz perguntar se realmente foi obra do acaso ou do divino. A situação do vendedor fica pior quando ele descobre que o seguro que havia pago para sua loja não cobria danos causados por catástrofes naturais. Após uma engraçadíssima discussão com o agente da seguradora, Kanji decide então processar o responsável pela destruição de sua loja. Ora, quem é o culpado por catástrofes naturais? Deus. E é exatamente ele quem Kanji pretende processar, mesmo que não tenha ideia dos desdobramentos que sua ação irá causar.
É a partir desse momento que o filme se torna muito interessante: Krishna, ou Deus, decide, pasmem, ajudar Kanji. E quando ele aparece, o faz com estilo. Primeiro porque é interpretado por Akshay Kumar, um galã boa-pinta que também já estrelou vários outros longas; segundo porque ele vem de óculos escuros e pilotando a moto mais maneira que você já viu Deus pilotar. Claro que se trata de uma comédia, mas é interessante ver aqui a relação que este filme estabelece com uma de suas figuras religiosas mais importantes.
Não há tristeza ao se tratar da religião, como acontece com o catolicismo, não há mártires e sim heróis. E como estamos tratando de um filme indiano, a música não poderia ficar de fora. Não se trata aqui de um musical, mas apenas de uma sequência com uma música interpretada pela dançarina Sonakshi Sinha, que ficará na sua cabeça ao longo de todo o longa: “Go Go Go Govinda!” (Govinda é uma das várias palavras para Deus).
A verdade é que OMG: Oh My God! é uma grande crítica à comercialização da religião. Ao longo do enredo somos apresentados aos gurus, os “representantes” de Deus na Terra – que responderão ao processo de Kanji -, e a intenção do filme de mostrar a hipocrisia desses homens, que muitas vezes vivem no luxo graças ao dinheiro dos fiéis, é clara. O desperdício de comida, que poderiam ser dadas aos pobres, em oferendas também é abordado e com certeza isso deve ter incomodado muita gente na Índia como incomodou muitos personagens no filme.
Essa é uma oportunidade maravilhosa de entrar em contato com a cultura de um país tão rico e pensá-la também de forma crítica. É importante também trazer esse pensamento crítico para nossa realidade: se seguimos alguma religião, devemos passar a pensar se ela é realmente tão justa como prega ser. Por mais difícil que essa tarefa seja, ela é necessária, afinal o objetivo deve ser sempre fazer o bem às pessoas e promover a paz – e por mais simples que isso pareça, a ganância facilmente consegue corromper esses objetivos. E se você não acredita em nenhuma religião, talvez este longa possa te abrir para novas perspectivas. O que com certeza fica claro é que não é necessário ir a um templo ou igreja nenhuma para fazer o bem e ser uma pessoa do bem.
Mas e no final, quem será que ganha esse processo? O homem descrente ou os representantes de Deus?