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Falando Sobre… | Bichas – O Documentário

Bichas, o documentário de Marlon Parente, é um dos filmes que mais deveria ser visto atualmente no Brasil. Lembram do meu pequeno discurso sobre o assunto no texto da segunda temporada de Sense8? Pois é, aqui eu chamo vocês para uma conversa mais profunda. O país que mais mata LGBTs no mundo é o nosso, e foi através de uma agressão sofrida pelo diretor do filme que o documentário surgiu.

Recife, Pernambuco, Nordeste. Um homem aborda dois amigos na rua e aponta uma arma para a cabeça de um deles: “Eu vou lhe matar porque você é uma bicha!“. A parte triste: isso ocorre todos os dias na nossa sociedade e muitos não sobrevivem para contar a história. A parte menos triste: o crime de ódio deu luz a este lindo documentário e voz às pessoas que precisam disso.

Estamos em junho de 2017, mês conhecido por dois grandes motivos: no Brasil é São João; no mundo é o mês do Orgulho LGBT. E claro, não podia terminar sem que fosse comentado sobre este assunto a partir de um discurso bem forte e que me rodeia o tempo inteiro: o nosso amado vale, como muitos conhecem. O documentário de Parente tem os depoimentos de seis meninos, inclusive seu amigo que estava na hora do crime, Italo Amorim, e de outros meninos – as monas –, que passam seus depoimentos com muita firmeza e emoção. Da saída do armário até a aceitação da palavra bicha, todos os seis contam um pouco de suas histórias e como foi difícil para eles desde dentro de casa até sair na rua. Da infância ao inferno que vira a adolescência.

Alguns pontos são necessários destacar aqui: o racismo dentro da comunidade LGBT, a importância da militância, a questão de gênero, a dificuldade da sua aceitação e as consequências disso e o mais importante, óbvio, a homofobia. A primeira vez que ouvi a palavra bicha também foi com desprezo na voz de pessoas, com ódio ao desconhecido, e na infância, sem ter nenhuma noção do significado. Assim como as bichas do documentário e tantas outras pessoas ao redor do mundo, cresci numa sociedade em que o diferente não é aceitável e que ser gay é visto como algo errado. Gostaria muito de estar escrevendo isso com uma mudança nos verbos, deixando-os no passado. Porém, mesmo em tempos de Pabllos Vittar e RuPauls, a nossa realidade é outra.

Infelizmente, Bichas não tem o mesmo alcance de Sense8, The L Word ou até mesmo da pequena produção nacional RED, a websérie. Mas é uma das produções mais dignas da atualidade só pela sinceridade e carisma com que foi feita. Realidade e ficção devem se misturar para levantar bandeiras, para passar adiante o discurso e, claro, mostrar que existe uma representatividade para pessoas que muitas vezes se sentem sozinhas e desamparadas por uma sociedade hipócrita. Quem é do vale sabe que a luta apenas pela sobrevivência é constante e diária, mesmo em lugares que parecem improváveis de acontecer algo de errado, como um shopping ou um cinema, afinal, viver não deveria incomodar.

Mas já que é in-cômodo para muitos ver o outro ser feliz, precisa-se de voz. E Bichas é sobre isso: a voz que as pessoas precisam ainda em tempos atuais. “Todo dia mais bicha. Todo dia um level a mais. Que nem um Pokémon“. E só para finalizar, queria agradecer as bichas de Marlon por serem guerreiras, lindas e fortes. Essa bandeira é nossa, viado! Como diz a rainha Pabllo Vittar: Quanto mais dor recebo, mais percebo que sou indestrutível“.