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American Gods | 1×02 – The Secret of Spoon

Num artigo de 2014, o blogueiro Henrique Carvalho definiu storytelling como “a mais antiga forma de passar conhecimento através de gerações. Representando também como olhamos para diversos fatos e tomamos opiniões, já que somos influenciados por histórias e pela forma como as interpretamos”. Essa capacidade de tomar opiniões factuais e interpretá-las, bem como o comentário social presente nas fantasias urbanas criadas por Neil Gaiman, conferiu o título de mestre do storytelling ao autor. Logo, é prazeroso notar que todos os aspectos inerentes às qualidades narrativas do seu texto estejam refletidos nos maiores acertos da versão live action de American Gods.

Por exemplo, quando os showrunners da série abrem o segundo episódio com mais um interlúdio que traz a chegada de um deus estrangeiro para a América e trazem esse tal deus como um representante de divindades africanas, dá-se espaço para um feroz discurso sobre o futuro de gerações escrito bem antes de se definir algo tão simples como o valor que a cor da pele de uma pessoa terá para sociedade contemporânea. E se na review passada eu elogiei todo o casting da série, aqui não poderia ser diferente, já que Orlando Jones dá vida a Compé Anansi, o deus aranha responsável pelo storytelling – olha a recorrência aqui – do povo Ashanti, com a classe inumana de um poderoso ser sobrenatural.

Não demora muito para a jornada de Shadow Moon tomar conta do enredo principal novamente, mas com a bem-vinda capacidade de fazer jus à arrepiante cold open. Na obra original, Shadow passa por este início livre de qualquer relação com o violento universo dos deuses e é bom notar essa inversão, já que acabamos comprando a sua amizade com o sedutor Mr. Wednesday ainda mais rápido. Shadow também confirma a traição da sua esposa de um jeito desconcertante – o Starz libera pintos como nenhum outro canal da TV, né? –, e por ora continuamos com uma visão unidimensional de Laura, o que tem me deixado curioso e até um pouco incomodado.

Felizmente, se Laura parece refletir um aspecto feminino um tanto quanto problemático, o mesmo não pode ser dito de outras figuras enigmáticas, como Bilquis, Media e as Zoryas. A deusa do amor, vivida pela hipnótica Yetide Badaki, continua envolta numa áurea de sensualidade que traz na cor vermelha toda a simbologia necessária para falar tudo o que se precisa sobre ela, sem dizer quase nada. Já Media é a deixa perfeita para a veterana Gillian Anderson brilhar. Aparecendo como a porta-voz dos novos deuses, mais precisamente a deusa da televisão, Anderson destrói já na sua primeira cena, tomando a forma de ninguém menos que Lucy Ricardo, ou mais precisamente Lucille Ball, para fazer uma proposta tentadora a Shadow.

As Zoryas chegam em The Secret of Spoon como a família do brutal Czernobog e possíveis aliadas da misteriosa reunião que vem sendo organizada por Wednesday. Ter nomes como Peter Stormare e Cloris Leachman como recorrentes numa série deveria ser a punch line de qualquer show que quisesse se alçar ao sucesso, e American Gods aproveita isso lindamente. Stormare também consegue roubar a cena como o deus eslavo da escuridão nos minutos finais do episódio só para coroar mais uma hora espetacular. Com Shadow perdendo uma aposta na casa das Zoryas e Czernobog ganhando uma vítima para o seu martelo, somos deixados à mercê de outro gancho fabuloso. É, meus caros, não demora muito para uma das apostas do ano se concretizar como a mais fantástica de todas elas. Já fui fisgado.

P.S.1: Na próxima review eu discuto mais sobre a identidade das Zoryas, já que deveremos conhecer a terceira irmã. Fiquem “loggados”.

P.S.2: Por ora eu só consigo pedir por mais Gillian Anderson. E vocês?

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