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Crítica | Mulher-Maravilha

Criada por William Moulton Marston, a Mulher-Maravilha apareceu nos quadrinhos pela primeira vez em 1941. De lá pra cá se passaram 76 anos e nesse meio tempo tivemos diversos filmes do Superman, do Batman, do Homem-Aranha e até do Homem-Formiga, graças ao bem-sucedido Universo Cinematográfico Marvel. Entretanto, a Mulher-Maravilha, um dos maiores ícones de super-herói, ainda não tinha um filme para chamar de seu. Muitos projetos engavetados e cancelados, mas nenhuma produção concreta levou a heroína para as telas de cinema. Pois bem, foi necessário chegarmos à era dos super-heróis em Hollywood para que, enfim, pudéssemos ver uma adaptação da história da Princesa Diana de Themyscira.

A longa espera não se justifica e felizmente, apesar dos pesares, estamos em um momento em que mulheres protagonizam filmes de heróis e ganham seu espaço no universo nerd. O melhor dessa história é que a Mulher-Maravilha se provou a melhor personagem do Universo Cinematográfico da DC, o que já podíamos sentir desde ano passado em Batman Vs Superman – A Origem da Justiça. Agora liderando seu próprio filme, temos não só o melhor filme da DC Comics nesta década (desculpa, Nolan, não acho Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge tudo isso), mas também um dos melhores filmes de herói dos últimos tempos, e olha que sou fã da Marvel disparado.

O enredo é bem simples, mas não simplista, o que é uma vantagem, visto as grandes ambições dos últimos dois títulos da DC: Batman Vs Superman – A Origem da Justiça e o inacreditavelmente vencedor do Oscar Esquadrão Suicida. Conhecemos a ilha das amazonas, Themyscira, onde vive Diana (Gal Gadot), filha de Hipólita e de ninguém menos que Zeus. Diana é treinada desde cedo para combater Ares, o deus da guerra, que vê a humanidade como uma criação equivocada de Zeus e que não merece existir. Tudo vai bem na ilha até que um piloto, Steve Trevor (Chris Pine, de Star Trek), literalmente cai dos céus por lá. Ele conhece Diana e fala sobre a grande guerra que a humanidade está passando. Convencida de que a guerra é obra de Ares, Diana parte de sua terra natal rumo ao nosso mundo e, assim, a aventura começa.

Mulher-Maravilha tem direção de Patty Jenkins. Eu, infelizmente, não conheço muito seu trabalho, mas admiro o resultado de sua direção no piloto da série The Killing (2011), um dos melhores pilotos que já assisti. Porém, Mulher-Maravilha exige um olhar completamente diferente, pois é inevitavelmente um filme de ação, como a maior parte dos filmes de herói, e The Killing era um mergulho no suspense. Além do mais, é de época, se passa durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1919), o que permite fazer um paralelo com Capitão América: O Primeiro Vingador (2011), outro filme de época que tem um herói como protagonista.

A diretora conseguiu imprimir sua estética e coordenar cenas de ação vibrantes que captam bem o estilo de atuação da Mulher-Maravilha e suas armas, como o Laço da Verdade. As sequências de combate, alternando entre a câmera lenta e o ritmo frenético, impõe um ritmo divertido e fascinante de se assistir, pecando apenas na escolha de alguns planos muito próximos (close-up) que acabam resultando em um efeito brega, porém não comprometem o todo, uma vez que aparecem com pouca frequência. O longa também apresenta uma fotografia diversa graças aos cenários múltiplos pelo qual a história se passa. Desde as belas e ensolaradas praias de Themyscira até obscuros campos de batalha e trincheiras que marcaram a Primeira Guerra Mundial.

O grande mérito do roteiro de Allan Heinberg é resgatar a ideia de afinal o que é um herói. A Princesa Diana tem uma visão de mundo totalmente diferente da dos humanos. Pode parecer uma inocência a princípio, mas, na verdade, ela é simplesmente mais consciente que a humanidade, por isso não entende a guerra de pessoas contra pessoas, entretanto não a ignora. Sendo filha de Zeus, ela encara desafios que as pessoas já consideram perdidos e resgata a esperança em quem já não tinha, sendo mais uma super-heroína do que o Superman e o Batman juntos nos filmes anteriores. O roteiro explorou bem situações entre a realidade de Diana e a realidade da humanidade. E isso tudo funciona bem porque, por ser um prólogo, não depende de outros filmes para ser compreendido, dando liberdade ao roteirista para criar uma história com começo, meio e fim, o que praticamente não acontece nos Universos Cinematográficos que visam as continuações e te obrigam a assistir diversas produções para se compreender o todo.

Outra qualidade desta produção é a química entre seu elenco. Gal Gadot é o destaque absoluto, com uma atuação carismática, que transmite a essência da personagem. A atriz, porém, tem mais facilidade em cenas de ação e humor do que nas de drama. Chris Pine também se garante no papel de Steve Trevor e tem os melhores diálogos do filme com Gadot quando discutem a comportamento humano. Para um filme sobre uma semideusa, o roteiro conseguiu manter um pé na realidade. O elenco conta também com Connie Nielsen (Boss), Robin Wright (House of Cards) e David Thewlis (Fargo) entre os principais.

Mulher-Maravilha não é um longa-metragem perfeito. Perde fôlego em seu terceiro ato e tem efeitos visuais questionáveis, mas se salva pela qualidade do roteiro que coloca a Mulher-Maravilha no século XXI de vez. Tem alguns clichês, como vilões alemães com ares de nazistas, sendo que os nazis só apareceriam posteriormente à Primeira Guerra, mas nada que comprometa a diversão e o entretenimento do público. No disputado verão americano de 2017, o filme consegue ser uma das melhores estreias, valendo mais a pena do que Piratas do Caribe – A Vingança de Salazar, por exemplo. Além disso é a primeira aventura de Diana na tela grande, enquanto que as últimas grandes produções que estão em cartaz são mais do mesmo.