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Crítica | O Castelo de Vidro

Algumas histórias fictícias nos cativam e emocionam, pois por mais que saibamos que aqueles acontecimentos não são verdadeiros, conseguem nos tocar por conta de sua verossimilhança que os aproximam de sentimentos reais. Há outras histórias, no entanto, que são reais e que nos fazem questionar como aquilo aconteceu sem que ninguém percebesse. Cria-se um laço com esse tipo de história a partir do momento em que nos identificamos com algum elemento presente na trama, por mais ímpar que pareça ser. E é o que acontece com O Castelo de Vidro.

O filme é baseado no livro homônimo da jornalista norte-americana Jeannette Walls. O enredo trata de sua infância e a de seus irmãos, criados de forma atípica por pais que possuíam uma diferente perspectiva da vida. Eram pobres e não possuíam endereço fixo, não permanecendo muito tempo no mesmo lugar. A instabilidade aumenta uma vez que a família precisa lidar com o alcoolismo do pai, Rex Walls, homem de personalidade forte que sempre acreditou estar fazendo o melhor por sua família. Ao passo que Jeannette cresce, viver naquela realidade e conviver com seu pai tornam-se tarefas cada vez mais complicadas. Os sonhos e promessas de infância da construção de um castelo de vidro desmoronam, e dos destroços nascem a vontade de sair de casa e ter uma vida melhor, mesmo que isso signifique não mais falar com o pai.

O Castelo de Vidro tem Destin Cretton (Temporário 12) como diretor que, mais uma vez, trabalha com a vencedora do Oscar Brie Larson, no papel de Jeannette Walls. O filme conta ainda com Naomi Watts, que interpreta a mãe de Jeannette, enquanto o controverso Rex Walls é vivido por Woody Harrelson, e com certeza essa foi a escolha certa. A intensidade com a qual Woody interpreta seu papel não deixa dúvidas sobre o tipo de homem – inteligente e ao mesmo tempo atormentado por demônios internos – que Rex era. Brie Larson também nos apresenta uma personagem forte. Jeannette soube se camuflar na normalidade da sociedade – tudo o que sua família não tinha -, mas ao mesmo também nos passa a sensação de insatisfação com aquele marasmo, deixando claro que em nenhum momento ela esqueceu a maneira distinta como fora criada.

A história nos é apresentada em duas épocas diferentes: o presente, no qual Jeannette já é jornalista e vive uma vida de luxo comparada a de seus pais, e o passado, que retrata sua infância humilde, recheada de momentos intensos, felizes e tristes, percorrendo diversos lugares do país até finalmente se estabelecer em Nova York. A dualidade que o filme ressalta é incrível, marcada não apenas pela elegância da vida atual de Jeannette, mas também por sua aparência e pelos lugares que frequenta. Desta forma, temos também cenários bem distintos que marcam a distância física, mas também simbólica, que Jeannette impôs a seus pais quando finalmente conseguiu sair de casa.

É claro que por traz de todo o drama está a conturbada relação pai e filha. Rex sempre foi alvo de admiração de Jeannette, ele sempre cuidou dela do seu jeito torto, mas a cada promessa quebrada, a cada desilusão, ela foi endurecendo e se afastando de uma das pessoas que mais amava. Por muito tempo foi capaz de negar sua origem e viveu uma vida superficial totalmente distinta da verdade que seu pai sempre pregou. Jeannette não estava feliz com a pessoa que se tornara, mas também era muito difícil aceitar que a pessoa que queria ser lembrava muito seu pai. Esse com certeza é um ponto capaz de tocar muitas pessoas. Relações familiares nunca são simples e a sinceridade com a qual Jeannette retrata sua história consegue deixar qualquer um que assista ao filme completamente emocionado.